Ideias novas para móveis velhos numa loja diferente situada no Campo de Santa Clara
REPORTAGEM
Rui Lagartinho
Texto
Paula Ferreira
Fotografia
VIDA NA CIDADE
São Vicente
10 Outubro, 2016
Se houvesse que atribuir um prémio para uma loja lisboeta – no sentido romântico e cinematográfico da “loja de bairro” – que melhor se autodefinisse, a Metamortaforico seria uma séria candidata. Situada no Campo de Santa Clara, e aproveitando a proximidade à Feira da Ladra, cria peças a partir de despojos. O cartaz da loja é todo um caderno de intenções, ao prometer a “transformacolização de tralhomonos e metáforas unissexo para todas as idades.” Um exemplo de como o comércio de proximidade pode fugir à massificação.
No dia em que O Corvo visitou a loja Metamortaforico, Anabela Moreira tinha um pé no antigo espaço, o outro no novo – na porta do lado – e a cabeça, como sempre, em muitos lados. Os dois situam-se no melhor sítio de Lisboa para quem tem como palavras de ordem “recuperar”, “restaurar” e “reciclar”: uma esquina do Campo de Santa Clara. Aqui, duas vezes por semana, a Feira da Ladra está à porta.
“Quase tudo o que aqui está são coisas que eu compro na feira”, garante-nos Anabela, a quem invejamos o olho clínico para descortinar na floresta de roupa velha, cópias foleiras e armadilhas para turistas e arrivistas, verdadeiras pérolas. O que vemos à volta cheira a novo, está pronto a ter uma nova vida, seja ele um candeeiro, um espelho, várias cadeiras ou uma cómoda que, de repente, ganham asas de resina, graças a libélulas que lembram a leveza das peças de René Lalique – mestre vidreiro e joalheiro francês, que viveu entre 1860 e 1940.

Há no ar uma nostalgia, onde se misturam travos do revivalismo orientalizante que, no Ocidente, há cem anos, marcou a Arte Nova e onde a influência da natureza marcava cada peça. Anabela, que deixou de dar aulas para se dedicar a ser artesã, escultora de vários materiais, faz peças por pura inspiração ou aceita encomendas.
“Cada cadeira pode levar um mês em metamorfoses várias, até estar pronta. É um processo orgânico e de laboratório”, orgulha-se a artista. Para além das cadeiras, há biombos onde se esparramam a sombra de um lagarto, malas de viagem com umas contraditórias raízes. Há um pouco de país das maravilhas, há objectos que podiam ser requisitados para um filme de Tim Burton.

Quando a nova loja estiver pronta, terá um espaço de cafetaria, para se estar com calma e apreciar o que está exposto – e, claro, levar as ideias de Anabela já prontas para casa ou deixar-lhes novos desafios.